Ao chegar no Cairo, no dia 23 de outubro, trazia comigo uma certeza de que iriam ser muito difíceis os dias que eu e o Rodrigo Cerqueira viveríamos no deserto.
Vi que o Cairo tem grandes problemas de poluição, um trânsito caótico e que a pobreza também é marcante.
Eu reencontrei amigos que havia conhecido em Gobi, na China, e o Rodrigo que chegou um dia depois de mim.
No dia 25 de outubro, um comboio de ônibus sendo escoltados por policiais federais e civis partiu do Cairo rumo ao acampamento no deserto. Viajamos cerca de 7 horas, desembarcamos dos ônibus, entramos em carros com tração nas quatros rodas e chegamos no acampamento, onde os beduinos nos receberam com um jantar e música. Fazia frio. Ao ver o terreno senti que iria ser muito difícil correr, pois a areia fina fazia com que os pés afundassem e isso forçava mais a musculatura.
No dia 26 de outubro minha mochila pesava 11 Kg. Eu estava preocupado com o esforço e como terminaria o primeiro dia. Conversei muito com o Rodrigo Cerqueira na tenda, onde ficamos com atletas da África do Sul, Estados Unidos e Inglaterra.
Após correr a primeira etapa eu estava exausto, as pernas tinham algumas câimbras e a sensação era de ter corrido uma prova duas vezes maior do que a que tínhamos corrido, mas fiquei feliz com os meus pés, que não apresentaram nenhuma bolha. Como havia feito em Gobi, em que usei o Crocs para correr nas montanhas, também corri o deserto do Saara com Crocs e as pessoas colocaram um apelido em mim na primeira noite: o Mr. Crocs ou Homem Crocodilo. Também senti que o meu treinamento em areia fez algum efeito, pois melhorei bastante o meu tempo em relação a Gobi.
Na segunda etapa, recuperado das câimbras e preocupado com a hidratação, fiz uma corrida mais tranquila e sempre procurando manter o mesmo ritmo, que me desse reserva para o dia seguinte. O sol e a areia castigaram a todos. Era difícil até tentar falar alguma coisa de tanta exaustão. Passamos para a terceira etapa, onde nos deparamos com um terreno ainda mais cruel - as dunas. Elas me lembravam o feitiço das sereias, que nos atraem para o fundo do mar. A beleza das dunas era mortal, pois o esforço muscular a cada subida nos deixava alucinados e fracos... Incrivelmente, só pensei em uma coisa nesse momento extremo de subir as dunas: tomar café. O cheiro do cafe me veio no nariz, parecia que se eu tomasse uma xícara de cafe eu teria força para subir as dunas escaldantes com muito mais energia.
Na quarta etapa eu pensava somente em terminar. Não pensei em momento algum em qual posição ficaria, pois em um ambiente como o Saara, chegar era uma grande e majestosa vitória. O Rodrigo Cerqueira e eu formávamos a dupla de brasileiros que, somados, cada passo nosso se multiplicaria na grande nação que é o BRASIL. Nós seguimos dando força um ao outro e isso me fez sentir muito melhor, por ter ganho um grande amigo tão longe de casa.
Partimos para a quinta e mais dura etapa, sentindo o ambiente do acampamento em cada rosto de cada atleta. A ansiedade e o frio na espinha de cruzar o deserto dia e noite eram notórios, afinal eram 100 Km depois de ter corrido 4 etapas tão duras. Eu e o Rodrigo mantivemos um ritmo de 5,5 km por hora durante 20 e 17 minutos, cruzando todo o dia e a noite juntos, parando 15 minutos a cada 11 km. Uma vez só paramos 25 minutos para preparar nossa comida, antes de continuar noite adentro.
Depois de um esforço monstruoso, de sentir o forte calor do dia e receber os fortes ventos gelados da noite, avistamos a luz do acampamento. Ali, sentimos algo grandioso, único, emocionante... nos superamos e chegamos às 4h17 da manhã em nosso objetivo. Nesse momento o choro nos fugia aos olhos, misturado ao sorriso. Éramos como criança novamente... dos 100% faltavam apenas 10% para beijar uma medalha tão desejada e tão dificil de ser conquistada.
No dia 01 de novembro, partimos para a uma prova curta, mas que também nos obrigou a buscar forças no fundo da alma. Eram 5,9 Km subindo na areia quente. No final, a grande visão das pirâmides de Giza, camelos, música, aplausos sorrisos, abraços, muito choro. Havíamos conquistado um sonho, um grande sonho de completar os 254 Km do deserto mais quente do planeta.
Durante toda a prova, muitas pessoas de várias partes do mundo me enviaram mensagens; vieram mensagens do Vietan, China, EUA, Itália, Chile, Alemanha, Singapura, Malásia e o meu grande Brasil! Eu agradeço a cada mensagem, pois guando chegava no acampamento, cansado e cheio de dores pelo corpo, o pensamento vinha para a família e lembrava do meu filho todo tempo; minha mãe, minhas irmãs, meus amigos... as mensagens eram a fonte de reorganizar nosso ânimo para seguir adiante.
A Crocs foi a grande responsável por eu chegar no Saara. Eu tenho que aplaudir de pé essa empresa e dizer que o solo do deserto foi extremo, mas meus pés ficaram sem bolhas pois vestiam Crocs. Estou feliz pois tenho como filosofia de vida a qualidade de vida, e os Crocs mantiveram minha qualidade em um dos terrenos mais hostis do planeta. Os atletas viam meu pé e falavam estar com raiva por eu não ter bolha ou "Inacreditável! Você correu ou flutuou na areia? A toda família Crocs um muito obrigado!
Chego dia 06 de novembro no Brasil, às 7 horas da manhã. Brasil, essa conquista é de todos. Muito obrigado pela torcida! Mãe, estou com fome do seu feijão.
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